Você quer uma cultura forte na sua empresa? Aposte na confiança

Dentre as bases necessárias à construção do “Ciclo de Crescimento” da organização, os empreendedores devem criar e inspirar a relação de confiança com o time, direcionada à busca permanente de melhores resultados, como base da cultura organizacional.

Que uma empresa são as pessoas que nela trabalham, você já deve saber de cor e salteado. É por isso que no Portal Endeavor existem tantos artigos, ebooks e outros conteúdos criados para que você consiga aprimorar a qualidade da sua gestão do time. Os desafios são inúmeros quanto à construção e desdobramento das metas (ciclos de planejamento e execução) e aos processos de gente: recrutamento, integração, desenvolvimento, engajamento, incentivos e reconhecimento de talentos e por aí vai. O engajamento com a cultura organizacional passa por sua correta percepção, protagonismo dos líderes, construção e aprimoramento de processos de gente.

 

A confiança é construída por meio de relações pessoais
A construção e a aceitação da cultura organizacional está assentada numa série de relações entre pessoas que fomentam ou travam os processos estratégicos de gente. Cada relação representa, em nível individual, o farol difusor ou bloqueador da cultura. Se há confiança, o ciclo virtuoso é disparado; se não há, o inverso acontece. Em última instância, como o meu líder ou o meu par se relacionam comigo importa mais para a pessoa do que o discurso oficial da empresa. Lembre-se do ditado “uma pessoa não deixa a empresa, ele deixa o seu líder”.

Vamos abordar o assunto do desenvolvimento da confiança junto ao time como alavanca do “Ciclo de Crescimento” de forma mais abrangente e estratégica, partindo da minha experiência como empreendedor na construção de negócios e no varejo multicanal, como mentor Endeavor e ex-consultor em Gestão para Resultados. Alguém que testou modelos, que errou e que correu atrás para aprimorá-los.

 

O DNA começa com a visão e os capítulos da construção da empresa
A estratégia de gente, naturalmente, será impactada pela história dos fundadores e sócios da empresa, ou seja, como a ideia foi construída. Quem são as pessoas envolvidas na criação de uma organização? O que sonham atingir? O que elas valorizam? Qual o processo de decisão? Como inspiram outras pessoas a lutarem por objetivos comuns? Tudo isso vai compondo o próprio DNA da companhia e seu propósito de existência.

Os primeiros capítulos da empresa já trazem as bases a uma cultura organizacional, ainda que essas questões não estejam tão claras ou escritas. Portanto, vale o exercício de recapitular a história de construção do negócio, dos seus primeiros empreendedores e executivos. A reflexão poderá trazer valiosos insights sofre fatos que moldaram o modelo de negócio e comportamento atual da organização. As principais histórias –aonde queríamos chegar, vitórias, derrotas, aprendizado– precisam ser contadas a todos, desde a imersão dos novos até durante as reuniões de resultados.

E o grande desafio, como você já deve ter constatado no seu dia a dia, é entender a essência da cultura e mantê-la viva durante o crescimento. Uma grande dor do crescimento. Parte dos empreendedores acaba se perdendo aí. Formalizados ou não, é importante manter vivos e perceptíveis os valores e o propósito de ser da organização.

 

Líderes são protagonistas na difusão da história e da cultura da empresa
A cultura da empresa é comunicada de pessoa para pessoa, mas a comunicação só traz bons frutos quando há confiança entre as partes e abertura para escutar. Líder e liderados, pares com pares, liderados e líderes. Se não confio no meu líder, não o escuto, não priorizo o que ele diz. A abertura para escutar o que o outro tem a dizer, a confiança, é gatilho para identificação e resolução de problemas reais e difusão da cultura; portanto para o próprio crescimento da organização.

Neste processo de difusão da cultura, os líderes são os protagonistas, os responsáveis por recordar o entendimento, explicar os critérios e traduzir os valores no dia a dia das pessoas. Quando a cultura de uma organização, com sua visão, seu propósito e seus valores, está registrada e é efetivamente compartilhada (transformada em padrões no dia a dia), a agitação da “rádio peão” tende a diminuir, pois os caminhos a seguir e forma de decisão são bem mais transparentes.

 

Líderes mantêm viva a cultura por meio do exemplo
Os mais novos olham para a referência daqueles com mais tempo de casa ou de atuação destacada: metas desafiadoras atingidas, projetos importantes executados com louvor, sócios e conselheiros da empresa, funções exercidas. Apesar de o assunto ser muito explorado nos artigos de empreendedorismo, quase um mantra, nunca é suficiente reforçar a importância dos líderes serem percebidos como exemplo pelo time. E nesse “percebidos como exemplo” há todo o desafio da comunicação: mal-entendidos, desatenção às mensagens, falta de carisma e clareza. A intenção do líder, frequentemente, passa longe do que o time percebe como realidade.

No entanto, ações simples dos líderes ajudam na difusão da cultura. Aproveite as reuniões de resultado para contar as conquistas, os erros, o aprendizado para o crescimento do negócio visando a dar vida ao DNA da empresa e as razões pelas quais ele ajudou a todos a crescer.

Outras coisas simples podem ser implementadas: bate-papo com líderes, entendimento do sonho grande e seus desdobramentos (ex.: metas anuais, ações de crescimento, novas competências necessárias), exemplos de atitude esperada, feedbacks frequentes, grupos de cumbuca, adequação do ambiente físico à cultura. A construção e o reforço da cultura podem ser sistematizados por meio de processos prioritários de gente, vamos repassar a essência deles.

 

Executando as estratégias de gente – a atração de talentos
Uma vez que você tem bem claros a história e os valores da sua empresa, chega o momento de pensar a questão de forma mais próxima do dia a dia das pessoas. Começando, claro, pela atração e retenção de talentos.

A primeira pergunta a ser feita é: “onde vou encontrar o talento certo?” Se, por exemplo, você está precisando de um designer, dificilmente vai encontrá-lo numa cidade sem formação em design ou sem empresas que formem tais competências. Você terá que atrair o talento de outros lugares!

Você precisa conhecer os lugares onde os potenciais candidatos estão, quais universidades frequentaram ou frequentam, de quais redes participam, quais blogueiros leem, e por aí vai. É imersão mesmo, sem delegar para terceiros, para entender se aquele grupo compõe um perfil ideal para sua empresa, antes mesmo de começar a recrutar.

À época da atuação no varejo, costumávamos levar nossos times às faculdades para divulgar programas de talentos. Dependendo das oportunidades abertas, envolvíamos mais pessoas: o time de desenvolvimento de produtos apresentava o programa para alunos de design, o de financeiro falava com estudantes de administração, etc.

Esse cuidado no recrutamento é fundamental para o casamento de perfis e competências com a empresa. Caso seja mal conduzido, você pode gastar horas com coachings ou treinamentos que não conseguirá mudar um perfil inadequado. E a saída da pessoa (turn-over) certamente virá, uma hora ou outra.

 

Onboarding: aqui, todo cuidado (também) é pouco
Executado o processo de recrutamento e seleção, falemos agora sobre o processo de onboarding, ou imersão para a boa parte do mundo corporativo. É quando a sua empresa poderá inserir, de fato, os novos contratados na operação.

 

Cada organização tem suas particularidades; mas um onboarding bem feito não deve prescindir de:

Atividades de integração com os demais membros do time;
Conhecimento do funcionamento das áreas (visão sistêmica), com destaque para aquelas relacionadas diretamente com o cliente (ex.: vendas, inovação, atendimento ao cliente);
Treinamentos teóricos e práticos (on-the-job training): cultura organizacional, comportamental, técnico (função, políticas, rotinas detalhadas);
Acompanhamento do trabalho por líderes.
Um exemplo é o onboarding do setor de “Relacionamento com o Cliente” de uma empresa multinacional do setor de locação de veículos. O processo costuma durar algumas semanas, os elementos acima são tratados com bastante zelo. A atitude pró-cliente é visível em cada etapa do trabalho de imersão.

Os indicadores de satisfação dos novos integrantes (NPS contratação, NPS 3 meses), turn-over e tempo de recrutamento (time to fill) são opções para quantificar a situação atual frente o desejado (meta). Com um a dois anos de dedicação e foco dos líderes da empresa, é possível construir e evoluir significativamente o processo de atração e onboarding, bem como gerar uma boa reputação da marca junto aos públicos-alvo.

 

Ciclo de Treinamento e Ciclo de Feedback: os irmãos siameses
Uma vez realizado o onboarding, o próximo alvo passa a ser o desenvolvimento do novo colaborador. É o momento de planejar e executar os treinamentos necessários para a pessoa entregar os resultados esperados. O objetivo é construir e aprimorar, continuamente, a trilha de capacitação, incentivando a disseminação dos conhecimentos necessários às atuais e futuras metas e atividades (matriz de competências da função e matriz de treinamentos), papel de líderes e reforço da cultura organizacional.

A periodicidade dos ciclos de treinamentos se dá conforme as necessidades de cada área em atingir suas metas e de colaborar com o atingimento das metas das demais áreas da organização. Quanto mais frequente, melhor. O primeiro grupo de treinamentos depende mais da ação do líder, tem baixo custo e alto retorno, como:

  • On-the-job training (OJT): mais útil ao indivíduo, pois serve para ele absorver o conhecimento necessário para rodar o dia a dia. Segundo estudo do Professor Boris Groeysberg (Harvard Business School), 70% do aprendizado ao longo da carreira se dá executando as atividades (OJT), 20% por meio de mentor e 10% via treinamento formal;
  • Grupo de cumbuca, dada a sua flexibilidade e baixo investimento, pode rodar todas as semanas;
  • Mentorias e consultoria com especialistas em resolver problemas crônicos das áreas podem ocorrer mensalmente, de modo que as equipes tenham tempo de executar as melhorias propostas ao longo do próximo mês;
  • Treinamentos técnicos (setor) em plataformas digitais (Coursera, Fundação Bradesco, Udemy, etc).

O segundo grupo – a capacitação formal da empresa – trabalha com a questão do nivelamento das competências necessárias ao longo do crescimento da empresa e da carreira do time. É capitaneada pela área de Gente (Pessoas), porém depende do protagonismo dos líderes na estruturação e validação do conteúdo, dinâmicas e formas de avaliação do êxito. Há várias configurações possíveis para a construção da trilha de capacitação, conforme setor e segmento (varejo B2B, varejo B2C, indústria de alimentos, serviços financeiros, etc) e a cultura organizacional (principalmente valores). As empresas dão diversos nomes à capacitação formal: escola de negócios, universidade corporativa, programa de formação de líderes.

O NPS do time (conteúdo e instrutor), feito logo após o treinamento, é utilizado como termômetro do êxito do treinamento e pode gerar boas ideias de aprimoramento da trilha de carreira. É importante “rodar” os instrutores e mentores dedicados a cada conteúdo, de modo a oxigenar as melhores práticas, há muitos talentos a fim de colaborar com a capacitação da empresa, basta procurar com dedicação.

O “Ciclo de Treinamento” precisa se comunicar com o “Ciclo de Feedback” (formal ou informal), na medida em que o último gera insumos ricos sobre o nível de conhecimento do time:

  • Metas atingidas, metas perdidas;
  • Engajamento com a cultura organizacional;
  • Nível de confiança (líderes e pares). A confiança abre espaço, gera mais transparência, para o Feedback sincero e a execução de melhorias por parte da pessoa;
  • Capacidade de execução de rotinas críticas (operacional);
  • Recursos disponíveis;
  • Destaques e pontos fracos de conhecimento – individuais e da área;
  • Recomendações aprendizado para aumentar a capacidade de atingir metas.

Em suma, treinamento e feedback devem ser frentes integradas, irmãos siameses, com planejamento e execução forte. Formação nas competências necessárias e o impacto gerado na capacidade do time em atingir objetivos corporativos dentro da cultura. Os empreendedores de uma startup podem construir versão mais simplificada e adaptada ao seu porte e complexidade, focando na essência do que debatemos.

Como vimos, a execução das estratégias de gente é um processo que leva tempo, começa muito simples e vai se aprimorando. Começa com o compartilhamento da história e dos valores da sua empresa; passa pela busca cuidadosa de talentos, por processos aprofundados de onboarding, por treinamentos e por avaliações de desempenho.Quando tratada com a devida prioridade e tendo a confiança como “viabilizadora”, o time passará a entender que a cultura organizacional é valorizada.

Uma cultura organizacional que gere alto nível de engajamento e foco em atingir novos sonhos, resultados cada vez melhores, gera agilidade no teste de modelo de negócio (atual ou inovações) e pode disparar ciclo de crescimento escalável. Uma ótima cultura organizacional não compensa um modelo de negócio ruim, mas uma cultura organizacional fraca pode arruinar um modelo de negócio promissor.

 

Fonte: Endeavor